04/08/2015 - PEC 33 e o superpoderoso STF | |
A decisão de negar seguimento, tomada pelo Ministro Joaquim Barbosa, a recurso previsto no Regimento Interno do STF (embargos infringentes), interposto pela defesa de um dos condenados no processo conhecido como “Mensalão”, em nada surpreende os que acompanham a trajetória dele como julgador. Com efeito, ao negar o devido processo legal a quem até agora não teve direito a qualquer recurso, o Presidente do STF reiterou disposição de render graças à mídia e ao senso comum punitivo, mesmo que em detrimento de garantias individuais previstas da Constituição Federal. Neste caso, além de fundamentar posição valendo-se de analogia in malam partem, vedada pelo Direito Processual Penal, fez Sua Excelência também pouco caso do princípio da legalidade. Espero que a decisão singular seja revista pelo Plenário, ao qual certamente será levada por meio de agravo regimental, recurso cujo acolhimento terá o condão de submeter os embargos infringentes ao crivo da Corte. Esclareço não estar a exercer qualquer espécie de “torcida” quanto ao desfecho do julgamento, o que não me impede de desejar seja assegurada ao (s) réu(s) a franquia do due process of law. Pelas claras imbricações que um assunto tem com o outro – porque ambos, em maior ou menor grau, tratam da discricionariedade judicial -, aproveito para tecer algumas considerações sobre o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 33. A missão de resguardar a Constituição Federal (art. 102 da CF), como se sabe, incumbe ao STF. Nesse mister, impõe-se ao Supremo que exerça controle sobre o Poder Legislativo, aos fins de que não sejam validadas leis contrárias à CF (ainda que criadas por mera inépcia do Parlamento). Entretanto, pergunto: quem nos protege do STF e das suas interpretações eventualmente engajadas sob o ponto de vista político, ou simplesmente equivocadas? Que garantia se tem de que 11 ministros – escolhidos pelos critérios que todos conhecemos – possuam mais capacidade/idoneidade para decidir sobre os caminhos que pretendemos trilhar do que 594 parlamentares eleitos pelo voto popular (apesar de todas as críticas que estes mereçam)? Por isso, segundo penso, ao se exigir um quorum maior de ministros – como quer a PEC 33 – para que possa o STF considerar inconstitucional determinada norma – criada por quem para tanto possui legitimidade (o Parlamento) -, nada se faz além de aumentar o controle de constitucionalidade reclamado pelo sistema democrático, a par de se prestigiar ainda mais o princípio constitucional da separação dos Poderes. Demais disso, devolver-se ao povo (é o que prevê a PEC 33), destinatário final do produto de tais controvérsias (e quem pagará a conta), por meio de plebiscito, a palavra final sobre eventual discordância entre o Legislativo e o Judiciário – não sem antes permitir-se amplo e sereno debate sobre os temas em questão -, constituirá modo de estimular-lhe o exercício da atividade cidadã, respeitar-lhe a soberania e insuflar-lhe comprometimento com o sucesso das políticas adotadas a partir de então. Nem se diga que o papel contramajoritário do STF ficaria menoscabado nessa situação. Primeiro, porque tal atribuição não é exclusiva do STF, mas igualmente do Congresso Nacional. De fato, a este também cumpre proteger as minorias (especialmente pela oposição), uma das justificativas pelas quais deve o Parlamento se escusar da criação de leis demagógicas, casuísticas e arbitrárias. Depois, porque quanto maior for a interlocução democrática e respeitosa entre os Poderes – e desses com a população -, menores serão os riscos de que sejam promulgadas ou validadas regras que desrespeitem os direitos fundamentais, especialmente dos grupos com menor representação política ou numérica Por fim, a discussão sobre a PEC 33 talvez tenha estabelecido o momento para que haja uma maior reflexão sobre a forma como o STF tem interpretado o art. 102 da CF. Afinal, o Supremo diz a palavra final e definitiva sobre a (in) constitucionalidade da legislação somente porque o próprio Supremo assim entendeu que deve ser. Parece haver indícios de que o debate necessite mais abrangência... César Peres Presidente da Associação dos Criminalistas do RGS - Acriergs | |